ABIHV planeja R$ 63 bi de investimentos para trazer hidrogênio verde ao Brasil

Associação Brasileira da Indústria do Hidrogênio Verde engloba 36 empresas que pretendem desenvolver esta nova indústria no país nos próximos anos

Por Guilherme Camara (Brazil Economy)

Fernanda Delgado, CEO da ABIHV: Brasil é o principal polo de investimentos em hidrogênio verde

Fernanda Delgado, CEO da ABIHV: Brasil é o principal polo de investimentos em hidrogênio verde

“Queremos tirar a indústria do papel”. Para Fernanda Delgado, este é seu objetivo principal como CEO da Associação Brasileira da Indústria do Hidrogênio Verde (ABIHV), formada por um grupo de empresas líderes nos setores de energia, tecnologia e agro, como Vale, Eletrobras, White Martins, Comerc Energia, European Energy e Thyssenkrupp. “Atualmente, pouco mais de 20% do PIB brasileiro está entre nossas empresas associadas”, comemora a executiva.

Fernanda é uma das principais referências do mercado executivo de Oil & Gas no Brasil, com passagens pela Vale, Petrobras, Deloitte e Instituto Brasileiro do Petróleo (IBP), onde foi diretora e conheceu de perto as novidades das transições energéticas. Foi nesse período que decidiu direcionar sua carreira para o tema e encontrou no hidrogênio verde uma solução crucial para os processos de industrialização e descarbonização no Brasil.

O hidrogênio é o terceiro elemento mais abundante na superfície da Terra e tornou-se uma opção energética fundamental para contornar a crise ambiental que o planeta atravessa, já que foi descoberto um método de torná-lo limpo e sustentável: o uso de correntes elétricas que separam suas moléculas na água por meio de energias limpas e renováveis, como as de matriz hidrelétrica, eólica e solar, entre outras. Desse modo, não há emissão de carbono durante o processo. É o chamado hidrogênio verde, que serve de matéria-prima para a produção de aço, metanol, fertilizantes e amônia, produto utilizado como combustível naval e na operação de maquinário industrial.

“A ideia de se produzir hidrogênio verde é uma iniciativa que está nascendo e tomando forma no Brasil. O marco legal foi aprovado no ano passado e o Ministério de Minas e Energia está ajudando em sua implementação, mas ainda temos dificuldade de mão de obra, regulamentação e infraestrutura”, afirmou Fernanda.

A executiva lembra que as dificuldades são normais no momento em que uma tendência surge no mercado de energia, como ocorreu com o pré-sal e com o gás natural liquefeito. “Quando começaram a investir em gás natural, o valor era muito alto e hoje o preço da tecnologia já caiu, ajudando a baratear os produtos. O mesmo ocorreu com a energia eólica e solar, que eram opções menos eficientes e precisavam de leilões específicos do Estado”.

O ano de 2026 será o mais importante para companhias que querem investir no setor no Brasil, já que sete grandes projetos de empresas associadas à ABIHV estão em fase de decisão final de investimentos, ou seja, quando há a transição da fase de planejamento para a de implementação e, finalmente, são destinados os recursos financeiros para a compra de equipamentos. É também o momento em que ocorrem as assinaturas de contratos de engenharia. Cinco desses empreendimentos serão em Pecém, no Ceará, um em Suape, em Pernambuco, e um em Uberaba, Minas Gerais. Juntos, somam aproximadamente R$ 63 bilhões.

“Isto é um grande avanço para o país, já que estamos falando de uma indústria química, sofisticada e de alto valor agregado. Atualmente, o Brasil é o país com maior potencial para se investir na produção de hidrogênio verde, metanol, amônia e fertilizantes verdes, pois temos muitos recursos hídricos e uma posição geopolítica privilegiada que nos dá vantagens competitivas em relação a países que também estão correndo atrás, como China, Austrália e Marrocos.”

Quando questionada se o atual governo vem ajudando nessas iniciativas, Fernanda afirma que o tema está hoje na pauta estatal, o que gera uma boa perspectiva para os negócios. Mas ressalta que os empresários exigem mais rapidez para acompanhar as demandas do mercado. “É necessário um apoio federal a partir da construção de políticas públicas que incrementem o crescimento da indústria. O governo Lula tem apoiado, sim, mas sempre esperamos mais. Tivemos boas discussões para aprovar o marco legal e conseguimos a aprovação de projetos de lei importantes, já sancionados pelo presidente Lula, que, entre diversas vantagens, garantem R$ 18 bilhões em créditos fiscais para empresas que produzirem metanol, amônia e hidrogênio verde entre 2028 e 2032. Apesar disso, sabemos que a velocidade do investidor privado é sempre maior.”

Entre as empresas associadas da ABIHV, grande parte delas vem da Europa, com companhias francesas, dinamarquesas e espanholas. Na visão de Fernanda, isso ocorre porque os países europeus têm metas de emissão a serem cumpridas, mas o Brasil deve reforçar também suas parcerias com a Ásia. “A China, por exemplo, é uma grande fornecedora de equipamentos que ajudam a transformar água em hidrogênio. É um país bem empenhado nesse sentido, já que os dois maiores projetos de hidrogênio verde do mundo estão na Mongólia e na Arábia Saudita, ambos na Ásia.”

Outro setor que sai ganhando com a produção de hidrogênio verde é o de fertilizantes, um dos mais importantes do país por estar diretamente atrelado ao agronegócio. Quando a Rússia invadiu a Ucrânia, em 2022, houve um baque nos importadores desse produto, já que o Brasil dependia dos itens vindos da região em conflito. “Atualmente, 90% dos fertilizantes do Brasil são importados. Temos que trazer essa indústria para cá novamente, mas fazendo fertilizantes sustentáveis obtidos a partir do hidrogênio verde”, disse Fernanda.